Confiança. Familiares apelam à suspensão da hasta

A família dos fundadores da Fábrica Confiança apela à suspensão da hasta pública. 63 descendentes e familiares de Manuel dos Santos Pereira e Rosalvo da Silva Almeida, que fundaram a Saboaria e Perfumaria Confiança em 1894, assinaram uma carta que apela ao presidente da Câmara de Braga para que suspenda a hasta pública de alienação do edifício, agendada para 30 de Abril.

O número de signatários (63) concentra sobretudo “netos, bisnetos, trisnetos e respectivos cônjuges”, revela Hugo Coimbra, bisneto de Manuel dos Santos Pereira. O familiar diz que a carta é uma demonstração de que as famílias dos fundadores “se preocupam com o futuro e a preservação da memória” da Fábrica Confiança.

Alguns dos signatários, sobretudo os mais velhos, revela Hugo Coimbra, “consideram ser já uma guerra perdida” lutar pela Confiança mas sublinha que “enquanto houver vida, há esperança”. “Apesar de se considerar uma luta perdida, de muitas dificuldades, a família não quis deixar de tomar a sua posição”, assinala.

Familiar deixa críticas ao município

Hugo Coimbra deixa críticas ao município em todo o processo da Fábrica Confiança. O descendente de Manuel dos Santos Pereira lembra que “havia interesse da Câmara Municipal de Braga em preservar a memória da Fábrica e de lá ser criado um museu”. “Dizia o dr. Firmino Marques que o objectivo da compra da Fábrica Confiança era a existência de um museu no edifício”.

“Para nós foi uma grande tristeza e desilusão a inflexão total e essa mudança de rumo da Câmara Municipal com a decisão, perfeitamente absurda, de contrariar aquilo que defendia antes”, acusa. Hugo Coimbra recorda ainda que Ricardo Rio, presidente da autarquia, mostrou indiferença aquando da visita às instalações da antiga Fábrica Confiança de membros da Comissão Parlamentar da Cultura.

“O sr. Presidente da Câmara mandou um assessor e mostrou uma indiferença total relativamente à Assembleia da República e aos seus deputados. O nosso presidente de câmara disse que ganhou as eleições e tem o direito a fazer o que quer. Mostra uma posição inflexível”, rematou.

Leia aqui a Carta Aberta dos descendentes dos fundadores da Confiança:

Salvar a Memória, Salvar a Confiança

Fundada em 1894 pelos nossos antepassados Manuel dos Santos Pereira e Rosalvo da Silva Almeida, a Saboaria e Perfumaria Confiança foi sempre um motivo de orgulho para nossa família, para a cidade de Braga, cujo nome levou a todo o lado, e para o nosso país que tão bem representou internacionalmente. 

Para além da qualidade dos seus produtos, do seu aroma textura inigualáveis, do fabuloso design inovador dos seus rótulos e embalagens, a Confiança marcou a cidade de Braga também pelas condições de trabalho que proporcionou aos seus operários. Rosalvo de Almeida, em entrevista concedida em 1928 ao jornalista Manuel Araújo para o livro “Indústrias de Braga”, referia esse aspeto fundamental em que a Confiança se distinguia: “A nossa casa é das poucas que dispensa ao operário um carinho especial, procurando rodeá-lo da melhor e da mais eficaz assistência moral e material”. Especifica mais adiante que, “a título de prémio”, lhe são oferecidas várias regalias e também dispõe de médico “tanto para ele como para a família”, acrescentando: “Além disto, pagamos, em caso de doença e por tempo indeterminado, o ordenado por inteiro”, sublinhando também a excecionalidade deste procedimento: “Por aqui não há outra fábrica que faça o mesmo”. 

As virtudes da Confiança, acima referidas por um dos seus fundadores e comprovada por todos que, de um ou de outro modo, se relacionaram com esta grande empresa bracarense, alargaram-se também ao enriquecimento cultural dos seus trabalhadores, muitos antigos operários lembram ainda hoje as festas, os espetáculos e as sessões de cinema. 

Tudo o que foi referido anteriormente revela a importância da Perfumaria e Saboaria Confiança e acentua a necessidade da salvaguarda e recuperação do edifício, último exemplar urbano da arquitetura industrial do século XX. Na nossa opinião, o imóvel deve continuar na esfera pública, constituindo um centro interpretativo da memória da fábrica e de outras unidades industriais já desaparecidas e um espaço dedicado às artes e à cultura. Foi aliás essa razão pela qual foi adquirido pelo Município de Braga em 2011/2012 através de um processo de expropriação por utilidade pública com o propósito expresso de ser reabilitado e no âmbito de um consenso alargado quanto à salvaguarda deste marco da indústria bracarense e portuguesa. 

Do mesmo modo que aplaudiram à época a aquisição do edifício com o objetivo de o colocar ao serviço da cultura e da preservação da memória da fábrica, os descendentes, e respetivos cônjuges, de Manuel dos Santos Pereira e Rosalvo da Silva Almeida, abaixo nomeados, contestam a sua alienação a privados, considerando-a uma perda irreparável para a memória cultural da cidade de Braga. 

Em nome dessa memória histórica, que, no caso particular, se funde com a nossa memória familiar e com o orgulho que sentimos em sermos descendentes dos dois jovens visionários que há 125 anos fundaram a Confiança, apelamos ao senhor Presidente da Câmara de Braga para que suspenda a venda em hasta pública prevista para o próximo dia 30 e se sente à mesa com as associações culturais bracarenses reunidas na plataforma Salvar a Fábrica Confiança e se empenhe, juntamente com todos os que já se mostraram interessados, em encontrar um destino para o imóvel digno do seu passado e daquilo que significa para a memória coletiva dos bracarenses.


Braga, 22 de abril de 2019»

Áudio:

Bisneto de Manuel dos Santos Pereira diz que muitos dos signatários já consideram a preservação da Confiança uma “luta perdida”.

Pedro Magalhães
Pedro Magalhães

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